AGENOR CANDIDO

Sobreviver - Conviver - Prosperar
PROTOCOLOS DE LIBERDADE – versão original

A história da humanidade revela uma constante tensão entre a criação e a destruição, entre o avanço e o retrocesso. Desde seus primórdios, a espécie humana caminhou em uma linha tênue, marcada pela luta pela sobrevivência, pela dominação tribal e pelo risco permanente de autodestruição. Saltos tecnológicos sempre foram decisivos para o rumo civilizatório, mas foi apenas no século VI a.C., com Tales de Mileto e outros pensadores, que a filosofia passou a ser considerada como ciência e a razão se apresentou como guia para o conhecimento.

Chegando ao século XXI, deparamo-nos com uma contradição fundamental: nunca tivemos tanto acesso a informação e recursos tecnológicos, e, ao mesmo tempo, nunca estivemos tão distantes de uma racionalidade coerente com a realidade global. As fronteiras se tornam cada vez mais fluidas, blocos políticos e econômicos surgem como tentativas de integração, mas as culturas continuam a se confrontar em disputas de poder, interesses e narrativas.

Nesse cenário, observa-se que a humanidade se divide entre uma minoria capaz de compreender a complexidade de sua condição e uma maioria aprisionada pela nulidade cognitiva, incapaz de assimilar criticamente as transformações que a cercam. É nessa fissura que se estabelecem os paradoxos do presente: de um lado, avanços científicos e tecnológicos impressionantes; de outro, retrocessos políticos, sociais e culturais, sustentados por governos autoritários, regimes teocráticos e democracias frágeis que se apresentam como simulacros de liberdade.

A domesticação do fogo, marco inicial da civilização, até o salto quântico e a inteligência artificial, marca que inaugura uma nova era, configuram uma trajetória relativamente curta na escala temporal, mas decisiva para o destino da humanidade. A inteligência artificial, capaz de substituir a maior parte das profissões existentes, projeta um futuro em que milhões de indivíduos perderão a referência de uma carreira profissional. No entanto, mesmo esse aparente colapso carrega oportunidades: surgem debates sobre fundos compensatórios universais e novas formas de redistribuição de riqueza. Resistirão, sobretudo, as profissões ligadas à biodiversidade, à filosofia, à antropologia e à linguística, além das novas áreas tecnológicas, como a engenharia de dados e as ciências astrofísicas.

É nesse contexto que apresento a filosofia que denomino Cândido, uma proposta que se ergue sobre três eixos fundamentais: a compreensão da humanidade, os protocolos da liberdade e a realidade relativa. Cada eixo representa um campo essencial de análise e de intervenção, que, em conjunto, buscam propor um caminho de superação da crise civilizatória contemporânea.

A compreensão da humanidade exige, antes de tudo, a abordagem antropológica, que analisa o ser humano em sua totalidade — biológica, social, cultural e linguística. A antropologia evidencia que somos resultado de uma longa evolução física, mas também de processos simbólicos, culturais e sociais que moldaram nossas identidades. A diversidade de costumes, valores, crenças e linguagens constitui tanto a riqueza quanto a fragilidade da espécie.

Entretanto, no mundo contemporâneo, essa diversidade tornou-se um campo de conflito. A coexistência entre sociedades modernas, altamente tecnologizadas, e sociedades estagnadas em modelos sociais, econômicos ou religiosos ultrapassados, gera tensões profundas. O resultado é um cenário global em que convivem ditaduras, monarquias, regimes militares, socialismos, liberalismos, progressismos, anarquismos, fascismos e, mais recentemente, formas extremas de poder como a teocracia e o narcoterrorismo. A humanidade, contudo, persiste em sua busca por prosperidade econômica, revelando uma constante: o desejo de sobrevivência e de progresso, ainda que frequentemente conduzido por caminhos tortuosos.

Se a compreensão da humanidade nos revela os impasses de nossa condição, os protocolos da liberdade representam a tentativa de superação. A liberdade, muitas vezes idealizada de modo romântico, é manipulada por discursos de patriotismo irracional e por blocos geopolíticos que instrumentalizam povos inteiros. Em muitos casos, há reivindicações de direitos sem o correspondente cumprimento de deveres. A verdadeira liberdade, entretanto, nasce do respeito à escolha do outro e exige participação ativa: quem se cala diante das decisões coletivas abdica do direito de reclamar os resultados.

A liberdade só poderá ser efetivamente alcançada se houver protocolos universais capazes de assegurar justiça, transparência e democracia em escala global. Isso implica a elaboração de filtros éticos, jurídicos e políticos que sustentem uma ordem mundial comum. Uma constituição global pode parecer ficção, mas constitui uma necessidade histórica. A experiência da União Europeia, que levou cinco décadas para consolidar-se, indica a dimensão do desafio que a humanidade terá de enfrentar para criar princípios universais de convivência.

Nenhuma sociedade global será possível enquanto cada nação manipular suas constituições em benefício de elites ou interesses momentâneos. O reconhecimento da humanidade como uma única comunidade planetária é condição indispensável para que superemos o nacionalismo excludente e as falsas hierarquias culturais. Todos somos passageiros da mesma nave: o planeta Terra. Nesse contexto, a transparência deve ser absoluta: nada que diga respeito ao patrimônio público pode permanecer oculto.

O terceiro eixo da filosofia Cândido é a realidade relativa, que se fundamenta na centralidade do dinheiro como mediador das relações sociais. Thomas Jefferson já alertava que “o dinheiro é a causa de tudo”, e a história moderna confirma essa afirmação. O capitalismo consolidou-se como principal motor de desenvolvimento, capaz de gerar prosperidade e oportunidades para aqueles que conseguem se adaptar às suas exigências. Contudo, ao mesmo tempo em que promove a inovação, o capitalismo produz desigualdades profundas, deixando parcelas inteiras da população à margem do progresso.

É imprescindível, portanto, que as instituições públicas administrem os recursos coletivos com absoluta transparência, premiando o mérito e punindo a incompetência. Se o capitalismo é, até agora, o único sistema capaz de promover desenvolvimento em larga escala, ele deve ser complementado por mecanismos reparatórios que assegurem compensações às vítimas de sistemas atrasados e injustos. Somente a superação dos filtros impeditivos da globalização racional e a formação de uma federação econômica global poderão garantir o acesso universal ao conhecimento e à prosperidade.

A filosofia Cândido, assim, propõe-se como uma resposta ao dilema da humanidade contemporânea. Reconhece a fragilidade e a complexidade da espécie, mas insiste na possibilidade de superação por meio da racionalidade, da criação de protocolos universais, da valorização da transparência e da construção de uma ética planetária. O futuro da humanidade dependerá de sua capacidade de compreender a si mesma, de estabelecer protocolos comuns de liberdade e de enfrentar, com coragem e inteligência, a realidade relativa que organiza a vida social.

Se conseguirmos articular esses três eixos em um projeto comum, poderemos finalmente caminhar para uma civilização global à altura de nosso potencial, em que o ser humano deixe de ser refém de sua nulidade cognitiva e assuma plenamente sua condição de sujeito racional, criador e responsável por seu destino.

Agenor Candido, 15/09/2025


FREEDOM PROTOCOLS – English version

The history of humanity reveals a constant tension between creation and destruction, between advancement and regression. Since its beginnings, the human species has walked a fine line, marked by the struggle for survival, tribal domination, and the constant risk of self-destruction. Technological leaps have always been decisive for the course of civilization, but it was only in the 6th century BC, with Thales of Miletus and other thinkers, that philosophy began to be considered a science and reason emerged as a guide to knowledge.

Arriving in the 21st century, we face a fundamental contradiction: we have never had so much access to information and technological resources, and, at the same time, we have never been so distant from a rationality coherent with global reality. Borders become increasingly fluid, political and economic blocs emerge as attempts at integration, but cultures continue to clash in struggles over power, interests, and narratives.

In this scenario, humanity is divided between a minority capable of understanding the complexity of its condition and a majority trapped by cognitive nullity, incapable of critically assimilating the transformations that surround it. It is in this fissure that the paradoxes of the present are established: on the one hand, impressive scientific and technological advances; on the other, political, social, and cultural setbacks, sustained by authoritarian governments, theocratic regimes, and fragile democracies that present themselves as simulacra of freedom.

The domestication of fire, the starting point of civilization, to the quantum leap and artificial intelligence, the mark that inaugurates a new era, constitute a relatively short but decisive trajectory for the fate of humanity. Artificial intelligence, capable of replacing most existing professions, projects a future in which millions of individuals will lose the reference point of a professional career. However, even this apparent collapse carries opportunities: debates are emerging about universal compensation funds and new forms of wealth redistribution. Professions related to biodiversity, philosophy, anthropology, and linguistics, as well as new technological fields such as data engineering and astrophysical sciences, will hold out, above all.

It is in this context that I present the philosophy I call Cândido, a proposal built on three fundamental axes: the understanding of humanity, the protocols of freedom, and relative reality. Each axis represents an essential field of analysis and intervention, which, together, seek to propose a path to overcoming the contemporary civilizational crisis.

Understanding humanity requires, first and foremost, an anthropological approach, which analyzes human beings in their entirety—biological, social, cultural, and linguistic. Anthropology demonstrates that we are the result of a long physical evolution, but also of symbolic, cultural, and social processes that have shaped our identities. The diversity of customs, values, beliefs, and languages ​​constitutes both the richness and the fragility of the species.

However, in the contemporary world, this diversity has become a field of conflict. The coexistence of modern, highly technological societies with societies stagnant in outdated social, economic, or religious models generates profound tensions. The result is a global scenario where dictatorships, monarchies, military regimes, socialism, liberalism, progressivism, anarchism, fascism, and, more recently, extreme forms of power such as theocracy and narcoterrorism coexist. Humanity, however, persists in its pursuit of economic prosperity, revealing a constant: the desire for survival and progress, albeit often led by tortuous paths.

If understanding humanity reveals the impasses of our condition, the protocols of freedom represent an attempt to overcome them. Freedom, often idealized romantically, is manipulated by discourses of irrational patriotism and by geopolitical blocs that exploit entire peoples. In many cases, there are claims to rights without the corresponding fulfillment of duties. True freedom, however, arises from respect for the choices of others and requires active participation: those who remain silent in the face of collective decisions relinquish the right to demand the results.

Freedom can only be effectively achieved if there are universal protocols capable of ensuring justice, transparency, and democracy on a global scale. This implies the development of ethical, legal, and political filters that support a common world order. A global constitution may seem like fiction, but it is a historical necessity. The experience of the European Union, which took five decades to consolidate, indicates the scale of the challenge humanity will face in creating universal principles of coexistence.

Agenor Candido – 15/09/2025

Deixe comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos necessários são marcados com *.